*Dr.
Paulo Lima
Sinceramente eu não gostaria de
iniciar os meus escritos sobre a nossa música com outro título. É que morro e
não deixo de exaltar a música do meu estado, Pernambuco, rico de ritmos e sons,
nem do meu País. Não vou falar, genericamente, da MPB - a chamada música
popular brasileira - pois não reconheço neste termo qualquer sinônimo que
represente a música do Brasil e, por isto mesmo, prefiro chamar de música do
Brasil.
Sei, e alguns de vocês que já passaram
da casa dos cinqüenta, sabem muito bem, que devemos muito, ou melhor, o Brasil
deve muito a personagens como Gilberto Gil, Chico Buarque, Tom Jobim, Geraldo
Vandré, Nara Leão, Caetano Veloso e tantos outros que tiveram a coragem de ir para
frente do palco de uma televisão - igualmente corajosa -
refiro-me a TV Record, para gritar, através de suas composições, a insatisfação
de uma grande camada da população brasileira, representada pelos nossos jovens - ah, sempre eles, os nossos jovens - com
o estado de coisas (a ditadura militar) que tinha se imiscuído na nossa
cultura, no sentimento do povo, em nome de uma ideologia política e econômica
capitaneada pelos Estados Unidos de então, que, em decorrência da guerra fria,
travada com a União Soviética, findaram por impor uma ideologia que não se
harmonizava com o sentimento rebelde da juventude do Brasil, que ansiava por
mudanças, já que, desde o golpe militar de 1964, quatro anos haviam
transcorridos, sem qualquer alento de mudança numa situação política que, dia a
dia, desagradava mais e mais os nossos jovens e não mostrava nenhuma perspectiva
de mudança nesse quadro. E como eles eram sonhadores e corajosos!
Não é preciso que percorramos por
entre as artérias daquelas canções para saber como aqueles jovens representavam
a alma e a insatisfação de uma parcela considerável de nosso povo mais
esclarecido de então. Digo isto porque na cidade onde vivia desde o meu
nascimento, Vertentes, tinha pouco mais de seis, sete anos, não sei ao certo, e
o que ouvia e via nos rádios e nas TV´s era quase sempre um endeusamento do
País que representava o pensamento liberal de então - os Estados unidos - cuja
imagem faziam questão de propalar que era o melhor dos mundos! Os aparelhos de TV´s, eram artigos de luxo e
apenas duas ou três residências tinham esse item em nossa cidade. Até a Igreja Católica assim pregava - contra o
perigo comunista de então - posto que, através da chamada "Aliança para o
Progresso" tecia loas, através dos sermões dos párocos, a esta potência
econômica, irmã siamesa do capitalismo, já que, em troca, recebia e distribuía
parte da manteiga, do queijo e do leite em pó, de primeira qualidade, de forma "graciosa",
para as camadas mais pobres de nossa população, na qual me incluía, com a minha
família, isto depois que as famílias mais abastadas enchiam as suas despensas, numa
tentativa de mostrar que o perigo comunista não deveria nunca prosperar! E tal
intuito logrou pleno êxito, pelo menos durante certo tempo.
Deste modo, somente restava aos
nossos jovens, nas principais capitais do Brasil, Rio de Janeiro e São Paulo, soltar
a sua voz através da TV e, neste aspecto, os grandes festivais da música
popular brasileira tiveram uma contribuição fundamental, pois auxiliaram
cantores e compositores do quilate de Chico, Gil, Caetano e Vandré, dentre
outros, a gritarem em nome de um Brasil que não queria ser o espelho opaco dos
Estados Unidos, nem tampouco da ditadura militar, e não havia outra forma senão
soltar a sua voz para as platéias da TV Record, através dos grandes festivais
da música popular brasileira, cantando principalmente aquelas canções que
diziam que o Brasil queria mais, que o Brasil queira ser livre, como livre era
e ainda é o seu povo, desde a época do seu descobrimento, posto que o nosso índio
nunca deixou se escravizar, como sabemos.
Bons tempos aqueles.
Sei que alguns de vocês, que me lêem,
nem se lembram desses anos, posto que talvez ainda nem tivessem nascido. Mas,
repiso, a contribuição que essas pessoas deram para formar uma nova consciência
política e social no povo brasileiro, através da música, foi de fundamental
importância na formação da história recente da nossa sociedade. Sei, e vocês
sabem, que pessoas como Luiz Gonzaga, o nosso eterno "Rei do Baião",
que tão bem cantou a alma do nordestino, ou mesmo Roberto Carlos, eternizado
como o "Rei da Jovem Guarda", com suas músicas melosas, talvez devam
ter o seu espaço reservado nesse acervo cultural representado pela nossa música
popular. Mas, convenhamos, neste tocante fizeram muito pouco, ou quase nada. A
esse respeito não quero discutir.
No entanto, creio que ninguém,
absolutamente ninguém, jamais ousará questionar a importância desses jovens,
que, desafiando o poder de então, através dos grandes festivais da Música
Popular Brasileira tiveram a coragem de gritar, através de sua voz, a
insatisfação de uma parcela significativa de nossa sociedade de então, que não
queria ser oprimida por quem quer que fosse, em nome de uma ideologia política
alienígena, e o fizeram da forma mais linda que existe: através da canção! Bons
tempos aqueles...
Um abraço a todos.
*DR. PAULO ROBERTO DE LIMA é graduado em Filosofia pela Universidade
Católica, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Recife e advogado.
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